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Sonhadora


Reúno aqui, palavras, idéias e sentimentos. Se algum deles for seu e você não quiser que aqui estejam, me avise. Se algum deles for de alguém e estiver sem crédito, me conte. Espero que algum texto lhe toque assim como me tocou.


23 março 2007

Alberto Goldin - Pelo amor em linha reta

Pelo amor em linha reta


Tenho 26 anos, sou advogada, amo meu trabalho e tenho muitos amigos. Mas minha vida pessoal não vai bem. Tive meu primeiro namoro sério com Ronaldo, aos 23 anos. No início, era tudo maravilhoso. Depois de cinco meses, tornou-se algo doentio: comecei a ter um ciúme muito grande de uma vizinha dele. Comecei a ser possessiva, a querer saber tudo o que ele fazia, ligava sem parar para o celular dele. Ele não agüentou a pressão e terminou tudo. Ficamos separados, voltamos, depois ficamos mais alguns meses juntos, mas tudo se repetiu. Desta vez, quem terminou fui eu: não suportei meu comportamento. O tempo passou e hoje vejo tudo com outros olhos. Mas não consegui namorar mais por muito tempo: quando os problemas começam, eu termino. Tenho medo e insegurança de repetir o que fiz e me machucar. E medo de ficar sozinha para sempre. O que eu faço? Susana, Rio de Janeiro, RJ


Contato visual, sorrisos, sedução, cumplicidade, diálogo, aniversários, signos, confissões, afinidades. Aprovado. Mais uma vez Susana tinha encontrado o grande amor da sua vida. Em poucas semanas, o céu obscurece, um disjuntor dispara dentro dela e um calafrio sacode seu corpo. Transfigurada, olha para a direita e para a esquerda, seu olhar se torna diabólico, sente cheiro de mulher à distância, especialmente o das jovens bonitas que cercam o namorado. Opta por uma delas e então, celular em punho, monitora, vigia, persegue. Ocorrem discussões intermináveis até a inevitável ruptura. Susana pode prever a fatídica seqüência, mas é incapaz de evitá-la e, como último recurso e para não enlouquecer, opta pela existência solitária.

Sua história, de alguma forma, surpreende. Era de se esperar que uma mulher apaixonada estivesse feliz e fosse mais doce e generosa. O amor melhora o humor. Mas uma força alheia à sua vontade a impulsiona no sentido de destruir justamente aquilo que ama. O problema não está na infidelidade masculina, nem na voracidade erótica das jovens modernas. O problema é de Susana, que está impedida de amar.

Lembrei-me de uma história bastante parecida e a localizei nos meus arquivos. Era uma jovem que também repetia seus fracassos amorosos por ciúmes. Na época, conseguimos esclarecer seus motivos: tratava-se de uma intensa rivalidade com sua mãe. Quando era adolescente, seus pais tinham se separado por motivos próprios. A jovem acreditava ter sido a responsável pela separação e, já adulta, expressava sua culpa com ataques de ciúmes com os seus namorados. Na sua lógica neurótica, por ter separado seus pais, estava condenada a se separar dos homens que amasse.

No meu arquivo, duas notas sublinhadas em vermelho me surpreenderam: uma dizia “Psicose — Hitchcock”, e a outra, “A reta é a menor distância entre dois pontos”. A referência à geometria se referia à sua forma triangular de amar. Os amores saudáveis operam em linha reta e são a menor distância entre os amantes. Os amores neuróticos inventam um terceiro que transforma a linha em triângulo e ameaça a relação. Às vezes, como neste caso, o terceiro é uma mulher; em outros, um homem, uma sogra, uma posição econômica, qualquer coisa que torne o triângulo infernal. A menção ao filme “Psicose” foi importante na terapia e precipitou sua compreensão. Seu personagem principal, Norman Bates, quando desejava uma mulher, enlouquecia e a matava. Minha paciente, quando amava, destruía a relação. Ambos, reféns do passado, “matavam” por amor. Os dois estavam possuídos por uma mãe fantasmática.


Sobre Susana, não sabemos como foi a relação com sua mãe. Mas podemos afirmar que, por sua perspectiva, não merece ser amada, tem certeza de que será enganada, o que independe dos fatos reais. Sobre esta certeza, só lhe resta saber como, quando e com quem a traição será cometida. Norman Bates estava preso à sua mãe, minha antiga paciente criava triângulos imaginários. Susana, por sua vez, precisa rever seu passado e se esforçar para seus novos amores serem em linha reta. É a menor distância entre dois seres humanos.


Jornal O Globo, coluna Alberto Goldin, 18 de março de 2007

2 Comments:

Anonymous Anônimo said...

Oi,

Gosto muito do Psicanalista e participo de uma comu.

Como vc fez para publicar esse texto? Copiou ou digitou?

Sorte e amor!!!

27 maio, 2008 22:56  
Anonymous Anônimo said...

Oi,

Gosto muito do Psicanalista e participo de uma comu.

Como vc fez para publicar esse texto? Copiou ou digitou?

Sorte e amor!!!

27 maio, 2008 22:57  

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